A vendedora Rosângela Biavati, 36, abriu os braços
para se despedir do mar. A chuva apertara e era momento de retirar os
meninos da água para irem embora. Despedia-se, sem saber, da própria
vida. Ainda na areia molhada, ela foi atingida por um raio que a matou
quase que instantaneamente. Todos os esforços para tentar ressuscitá-la
foram inúteis. A cena foi registrada por um fotógrafo que passava ontem
na orla da praia da Enseada, em Guarujá (SP). Dandy, como gostava de ser
chamada, passava o dia na praia aproveitando a última semana de férias.
Como recebia irmãos e sobrinhos em casa, vindos do sul do país,
decidiram fazer um “bate-volta” na cidade para matar a saudade do mar.
Estavam em 12 pessoas. Considerada muito alegre e
brincalhona, no caminho da praia ligou para colega de trabalho, Luana
Kessy, para brincar com a situação das duas numa segunda-feira. “Estou
indo para a praia. Vamos? se quiser eu passo aí para te pegar”, repete a
amiga, colega da loja de roupas Insensatez, em Ribeirão Pires (na
Grande São Paulo). Mesmo fechada para o comércio, a loja tornou-se ontem
um ponto de informações para amigos e clientes. A reportagem presenciou
quatro momentos em que clientes e funcionárias se abraçavam chorando ao
falar da assunto. “Ela era um anjo. Para mim, foi abduzida”, disse a
amiga e cliente Irlanda Alves.
“Ela me deu um livro de presente pouco antes do Ano
Novo. Eu disse que não conseguia emagrecer, então ela me deu ("Não
Consigo Emagrecer"). Ela mesma havia perdido sete quilos seguindo as
instruções”, disse a mulher, na frente da loja. Luana conta que, mesmo
sendo muito querida na loja, Dandy planejava deixar o emprego. Pretendia
dedicar a venda de cosméticos e, assim, conseguir passar mais tempo com
o filho Leonardo, 10. Quando foi atingida, Rosângela iria chamar o
filho que estava dentro d'água, ao lado de um primo. Os meninos nada
sofreram. A caminhonete do irmão Elias estava estacionada na areia para
praia para que recolhessem a motonáutica. “Foi tudo muito rápido. Ela
estava animada com o passeio”, disse ele.
O marido, Leandro Lopes Santos, 37, casado há cerca
de 13 anos, estava na praia com a mulher ajudou na tentativa de
socorro. Ele reclamou da falta de “estrutura adequada” para um
atendimento de emergência na praia no momento do acidente. “Não tinham
nenhum equipamento”, disse que teve ajuda de banhista e funcionários de
uma marina. O corpo de Rosângela foi liberado apenas na tarde de hoje do
IML de Guarujá. O corpo está sendo velado na noite de hoje no cemitério
Parque Vale dos Pinheirais, em Mauá (Grande SP).
Foi necessária autorização da Justiça para liberar o corpo, que deve ser cremado amanhã na capital paulista.
Cuidados
Quando a vendedora saiu do carro durante uma tempestade para entrar no mar, ela estava deixando o lugar mais seguro para ir ao mais perigoso. Essa foi a avaliação de Osmar Pinto Jr., físico do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), especialista em eletricidade atmosférica. A primeira precaução é nunca ficar na água, diz. Água salgada conduz eletricidade muito bem e o efeito do raio se propaga bem longe nela. Um raio dos mais fortes pode matar uma pessoa a 1 km de distância, mesmo que fique só com os pés na água ou na areia molhada.
Segundo Osmar, porém, mesmo quem fica na areia longe
do mar durante a tempestade está sob risco. Por estar num ambiente
plano, uma pessoa pode passar a ser o ponto mais alto de todo o entorno,
atraindo a descarga. O ideal é sair da praia e buscar abrigo dentro de
um carro ou uma casa, diz. Um raio pode ser atraído pelo corpo metálico
do carro, mas não penetra seu interior. Temporada de risco Praias não
são os locais onde mais ocorrem mortes por raios no Brasil, mas o
litoral paulista é especialmente vulnerável a tempestades elétricas. O
início do ano é um período de grande risco de incidentes, diz o Inpe,
porque está na alta temporada de raios (janeiro a março) e ainda durante
férias escolares, quando as praias estão cheias.
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