Por:Jerbson Moraes*
A decisão da juíza Wilma Alves Santos Vivas, da 25ª Zona Eleitoral de Ilhéus, publicada em 06/10, provocou novo abalo no cenário político local ao cassar o mandato do vereador Márcio Brandão (Bodão) e anular todos os votos recebidos pelo Avante. O caso, contudo, não é inédito na cidade e apresenta significativos paralelos com processos julgados anteriormente pelo mesmo juízo eleitoral.
HISTÓRICO DE CASOS SEMELHANTES EM ILHÉUS
Este é o terceiro caso de cassação por fraude à cota de gênero em Ilhéus nas eleições de 2024. Em março deste ano, o juiz Gustavo Henrique Almeida Lyra, também da 25ª Zona Eleitoral, determinou a anulação dos votos obtidos pelo Podemos e pelo Partido da Mulher Brasileira (PMB) por motivo similar.
Na ocasião, o magistrado reconheceu que as candidaturas de Victória Guiomar de Jesus Raimundo (Podemos) e de Mariângela Conceição Santos e Fabiana da Silva Nascimento (PMB) eram fictícias, tendo como único propósito o preenchimento formal do percentual mínimo de 30% de candidaturas femininas.
Assim como no caso atual envolvendo o Avante, aquelas decisões afetariam diretamente a composição da Câmara Municipal, com a cassação dos diplomas dos vereadores eleitos Odailson Pequeno (Podemos) e Neto da Saúde (PMB).
O PRECEDENTE DO EFEITO SUSPENSIVO
Como advogado especializado em direito eleitoral e conhecedor da dinâmica institucional local, posso afirmar que o principal ponto de atenção no caso do Avante está na provável repetição de um fenômeno jurídico ocorrido nos processos anteriores: a concessão de efeito suspensivo pelo TRE-BA.
Nos casos do Podemos e do PMB, o desembargador Danilo Costa Luiz, relator dos recursos no Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, concedeu efeito suspensivo às decisões de primeira instância. No caso específico do PMB, esta decisão permitiu que o vereador Neto da Saúde e Odailson Pequeno, continuassem exercendo o mandato enquanto o mérito do recurso é analisado.
A PREVENÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES
Um aspecto técnico-jurídico crucial neste cenário é o instituto da prevenção. Conforme o regimento interno do TRE-BA e o Código de Processo Civil, o mesmo relator que já apreciou casos semelhantes envolvendo a mesma circunscrição eleitoral fica prevento para julgar novos recursos relacionados à mesma matéria.
Na prática, isto significa que o desembargador Danilo Costa Luiz provavelmente será o relator do recurso que o Avante certamente interporá, abrindo caminho para uma provável concessão de efeito suspensivo também neste caso.
Esta previsão não é mera especulação, mas uma análise técnica baseada na observância dos princípios processuais e na coerência decisória do magistrado em casos análogos.
ANÁLISE COMPARATIVA DOS CASOS
Embora cada processo tenha suas peculiaridades, os três casos apresentam notáveis semelhanças:
1. Evidências probatórias: Tanto no caso do Avante quanto nos anteriores, a votação inexpressiva das candidatas (Mary Santos obteve apenas sete votos) foi considerada indício de fraude;
2. Argumentos de defesa: Em todos os casos, as defesas alegaram ausência de dolo ou justificaram a baixa votação por circunstâncias específicas;
3. Fundamentação das sentenças: As decisões seguem a mesma linha jurisprudencial do TSE, que entende que candidaturas femininas fictícias contaminam toda a chapa proporcional.
A principal diferença reside no fato de que, no caso do Avante, existem gravações de áudio em que a própria candidata Mary Santos admite ter aceitado o registro apenas para "compor a legenda" em troca de vantagem pessoal, elemento probatório que pode tornar mais difícil a reversão definitiva da sentença.
PERSPECTIVAS PARA O RECURSO DO AVANTE
Com base nos precedentes locais e na jurisprudência do TRE-BA, posso projetar o seguinte cenário para o caso do Avante:
1. Efeito suspensivo: Há alta probabilidade de concessão pelo desembargador Danilo Costa Luiz, seguindo o padrão adotado nos casos anteriores e considerando o princípio da segurança jurídica;
2. Mérito do recurso: A existência de áudio confessional representa um obstáculo significativo para a defesa, mas o TRE-BA tradicionalmente exige conjunto probatório robusto para manter cassações;
3. Tempo processual: A experiência nos casos anteriores sugere que o trâmite até decisão final pode se estender por vários meses, permitindo que o vereador "Bodão" continue no exercício do mandato enquanto isso.
IMPACTOS NO LEGISLATIVO MUNICIPAL
Como ex-presidente da Câmara de Ilhéus, considero preocupante a instabilidade jurídica que afeta três cadeiras do Legislativo municipal neste momento crucial, quando já estamos próximos de completar o primeiro ano de mandato. Caso todas as cassações sejam mantidas após o trânsito em julgado, a recomposição da Casa implicará na entrada de novos vereadores por meio da recontagem dos quocientes partidários.
Este cenário de instabilidade é especialmente problemático considerando que os vereadores já estabeleceram bases de trabalho, integram comissões permanentes e estão envolvidos em projetos importantes para o município. A substituição de parlamentares neste estágio do mandato causaria descontinuidade administrativa e política.
CONCLUSÃO
O caso do Avante em Ilhéus se insere em um contexto mais amplo de combate às fraudes eleitorais, especialmente aquelas que visam burlar as cotas de gênero. Todavia, a análise técnico-jurídica aponta para uma provável suspensão temporária dos efeitos da sentença, seguindo o padrão já estabelecido pelo TRE-BA nos casos do Podemos e do PMB.
A atuação do desembargador Danilo Costa Luiz será determinante neste processo, e sua provável designação como relator por prevenção traz um elemento de previsibilidade ao desfecho imediato do caso.
O grande desafio para o Avante, diferentemente dos casos anteriores, será superar a existência de provas diretas da fraude, como os áudios mencionados na decisão de primeira instância. Mesmo com a provável concessão de efeito suspensivo, a reversão definitiva da sentença apresenta-se como um obstáculo jurídico considerável.
Como estudioso do Direito Eleitoral e conhecedor da realidade política local, continuarei acompanhando atentamente este caso que, somado aos anteriores, estabelecerá importante jurisprudência regional sobre a efetividade das cotas de gênero nas eleições proporcionais.
*Jerbson Moraes é advogado especializado em Direito Eleitoral, ex-presidente da Câmara Municipal de Ilhéus e mestrando em Direito.
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